RESUMEN GRUPO DE TRBAJO 7

GT7. CIDADE, CORPO, FRONTEIRAS/ CUERPO, CIUDAD Y FRONTERAS

Coordinadores: Andrés Salcedo, Director del Departamento de Antropología, Universidad Nacional de Colombia. Bogotá. Investigador Centro de Estudios Sociales, asalcedofi@unal.edu.co, asalcedofidalgo@gmail.com.

Silvana de Souza Nascimento, Professora Doutora do Departamento de Antropologia, Universidade de São Paulo, Brasil. Pesquisadora do Núcleo de Antropologia Urbana (Nau-USP). silnasc@usp.br, simples.humano@gmail.com.

 

 

1ª sessão: Jovens, práticas urbanas e circulação/jovenes, prácticas urbanas y circulación

 

 

O SKATE NA EXPERIÊNCIA URBANA CONTEMPORÂNEA: UM ENSAIO PARA O ESPAÇO PÚBLICO

Guilherme Michelotto Boës (PUC-RS)

 

Com o crescente desenvolvimento das cidades suas arquiteturas sofrem significativas mudanças sobre o espaço público urbano. A partir disso temos que compreender a relação dos espaços públicos sobre as identidades, e as situações das relações sociais, entre a experiência cultural no espaço urbano e a sociabilidade fragmentada sobre a cidade contemporânea. Analisar os skatistas nos espaços públicos urbanos move a cidade para uma possibilidade de reconfortar os próprios significados de uso dos espaços que surgem nessas modificações das fronteiras espaciais, no encontro e desencontro dos grupos sociais. Devemos identificar os desafios com que as codificações dos espaços culturais da cidade se encontram em suas novas propriedades de direito de uso e manifestação social, já que produzem narrativas que alteram a produção dos espaços na inscrição de identidade social. Dessa situação, como o skate opera entre as fronteiras de interação dos espaços públicos urbanos que cada vez mais são abandonados em detrimento aos espaços privados? Pode o skate trazer a discussão sobre os espaços públicos, apontando que a tensão de sua oposição ao uso dos espaços públicos está longe da percepção de um processo ilícito de prática cultural urbana nos espaços públicos? Para tanto a antropologia urbana encontra o diálogo estabelecido entre a etnografia e a experiência urbana contemporânea, a associação das afirmações culturais nos novos espaços públicos e as manifestações sociais na produção da alteridade.

Palavras-chaves: skate; experiência urbana; cidade; espaço público.

 

 

OS MÚSICOS AMBULANTES: UMA ETNOGRAFIA MUSICAL DA CIDADE DE MONTREAL NO CANADÁ

Dalila Vasconcellos de Carvalho (Universidade de Montréal)

 

Embora a presença dos músicos ambulantes na província do Québec no Canadá remonte ao século XVIII, esta apresentação irá abordar uma tema que, de modo geral, é muito pouco estudado pela antropologia da música ou pela antropologia urbana: as práticas e as trajetorias dos músicos ambulantes e o significado destas na vida quotidiana da cidade. Ao contrário de outras profissões ambulantes que desapareceram dos grandes centros urbanos modernos, os músicos ambulantes permanecem pelas ruas mais movimentadas do centro de Montreal e pelos corredores do metrô desde a sua inauguração em 1966. Entretanto, pouco se sabe sobre eles: quem são? De onde vêm? Como vivem? Porque escolheram os espaços de circulação como a rua e/ou híbridos como os corredores do metrô para a prática musical? Na escassa bibliografia encontrada sobre o tema e em particular sobre os músicos ambulantes da cidade de Montréal, estes são vistos ora como artistas marginais descartados do mundo cultural estabelecido ora como personagens históricos. Assim que através de uma perspectiva etnográfica, a proposta deste trabalho é mostrar como, à partir de suas práticas musicais quotidianas, os músicos ambulantes mobilizam formas inéditas do fazer musical, bem como, de viver e fazer a cidade. Dito de outro modo, nosso objetivo é compreender como este fazer musical quotidiano, efêmero, banal, improvisado, que escapa as classificações do saber musical tradicional, estabelece uma relação social e simbólica com os pedestres, os espaços e a cidade.
Palavras-chave: músicos ambulantes, práticas, cidades, etnografia urbana.

 

 

“AQUI A GENTE TÁ VENDO INTEGRAÇÃO”: FLUXOS CULTURAIS JUVENIS ENTRE FRONTEIRAS

Gilberto Geribola (USP)

 

O artigo apresenta uma reflexão baseada nos apontamentos iniciais de uma pesquisa etnográfica realizada na região da tríplice fronteira (Brasil, Paraguai, Argentina) na qual são abordadas as interações de grupos juvenis residentes nas cidades fronteiriças. A pesquisa em curso foca a observação sobre as práticas culturais e a circulação de grupos juvenis nas cidades de Foz do Iguaçu (Brasil), Puerto Iguazu (Argentina) e Ciudad del Este (Paraguai). Articulando os temas juventude, cidades e fronteiras o trabalho visa contribuir para o entendimento das práticas culturais juvenis desenvolvidas na escala das pequenas e médias cidades, em especial aquelas que compõem regiões de fronteira. Neste artigo apresenta-se a etnografia de um grupo de maracatu sediado do lado brasileiro da tríplice fronteira apontando os deslocamentos do grupo para as cidades vizinhas que compõem a região fronteiriça, bem como de jovens argentinos e paraguaios que atravessam a fronteira para participarem dos ensaios e apresentações do grupo em Foz do Iguaçu e outras cidades da região. A etnografia sinaliza que as interações entre esses jovens de origens distintas no cenário fronteiriço instituem circuitos de práticas culturais juvenis marcados por integrações, sobreposições, deslocamentos e conflitos em um ambiente que pode ser caracterizado pelo desenvolvimento de “híbridos culturais”.

Palavras- chave: grupos juvenis, práticas culturais, cidades, fronteiras.

 

 

TANGO NA RUA: HAY QUE SABER BAILAR COM OS MILONGUEIROS PAULISTAS

Cristiana Felippe e Silva (PUC-SP)

 

A presente pesquisa etnográfica avalia o movimento denominado Tango na Rua, na Avenida Paulista, em São Paulo, como intervenção urbana de liminaridade, um espaço intermediário entre o público e o privado, com suspensão das estruturas cotidianas, mas organizado dentro de regras bem definidas em estado de communitas, a partir de conceitos de Victor Turner e José Guilherme Magnani. O baile de rua, disseminador da música rioplatense, e aberto a todos que queiram participar, é avaliado como performance na interface teórica da antropologia urbana e do corpo, como forma de interação e ocupação do espaço, possibilitando novos modos de circulação e apropriação da cidade. Pedestres e frequentadores da milonga de rua gratuita, realizada desde 2009, aos domingos, transformam a calçada em frente ao parque Trianon-Masp, ao som ligado na banca de jornal, em balés de pessoas, situações e atividades que nunca se repetem, citando Jane Jabocs. São atores sociais vistos como agentes capazes de modificar tanto física quanto simbolicamente os espaços da cidade, contrapondo-se às intenções de disciplinar o corpo em espaços privados. O tango na rua, onde se toca também ritmos brasileiros de forró e samba, expressa diferentes modos de viver na fronteira corporal, cultural e espacial. O movimento visa ressignificar e apropriar-se da cidade, criando encontros e sistemas simbólicos que produzem sentidos na troca e no reforço dos vínculos de sociabilidade.
Palavras-chave: tango;rua;corpo;liminaridade.

 

 

CIRCUITOS SONOROS DOS GRUPOS MUSICAIS GUARANI

 

Klaus Wernet (USP)

 

Os Bro Mc´s, grupo de Rap Guarani, moram na aldeia de Jaguapiru, localizada na cidade deDourados – MS, Brasil. O grupo vive atualmente uma capacidade de transitar entre distintos espaços, com uma lista grande de apresentações eles já tocaram em pequenas aldeias, assim como, em casas de shows localizadas na Capital de São Paulo. A circulação de sua produção audiovisual e sonora se da principalmente pelos cartões de memória de celulares e pela postagem de sua produção na internet. Eles são parte de um circuito sonoro Guarani que vem sendo estudado por mim no doutorado. A produção das bandas Guaranis, que executam gêneros musicais como Rap, Forró e Pop, é uma oportunidade para os estudos que visam abordar as distintas formas de interação e ocupação do espaço urbano, do espaço audiovisual e sonoro, e da capacidade de trânsito, em diferentes escalas, que permitem desenvolver novas associações entre corpos, sons, cidades, aldeias e cyber-espaços. Essas bandas, que cruzam e vivenciam diversas formas de fronteiras, estabelecem novas conexões, alianças e espaços que são conquistados pelos Guarani ampliando sua capacidade de reivindicações. Cabe ressaltar que outras etnias indígenas na América Latina também mantém bandas de Rap, e Pop, fato que gerou redes de conexões que impulsionam a circulação de idéias, pessoas, demandas e desejos, e geram uma forma singular de interação entre indígenas e não indígenas, aldeias e capitais, espaços concretos e virtuais.

Palavras-chave: Trânsitos, Interações, Grupos de música, População urbana, Guarani.

 

 

 

 

 

VIVIENDO A LO LARGO DE UN CIRCUITO: LOS SATERÉ- MAWÉ EN LA AMAZONIA BRASILEIRA

José Agnello Alves Dias de Andrade (USP)

 

La presente investigación indaga sobre la presencia indígena en las ciudades amazónicas brasileras, a partir de la experiencia del colectivo indígena conocido como Sateré-Mawé, localizado en la parte oriental del estado de Amazonas. A mediados de los años 1980 los Sateré-Mawé conquistaron la homologación de su Terra Indígena Andirá-Marau, nombre que deriva de los dos principales ríos sobre los que se localizan la mayor parte de sus aldeas. Sin embargo, los Sateré-Mawé habitan diversas ciudades vecinas a la Terra Indígena [resguardo] en el estado de Amazonas tales como Parintins, Berreirinha y Maués, así como la capital del estado, Manaus. El objetivo de esta investigación es caracterizar, por medio de la etnografía, las formas Sateré-Mawé de habitar el espacio urbano. En su circulación cotidiana ellos transitan por una multiplicidad de lugares que, en un análisis precipitado, podrían ser tomados como distantes: la floresta, la ciudad, la aldea, los ríos y riachuelos. Ciertamente cada uno de estos lugares tiene particularidades, pero están vinculados por las líneas, por los trayectos y por las historias de los Sateré-Mawé. Durante el trabajo de campo realizado en 2014, acompañé los Sateré-Mawé en sus desplazamientos entre las ciudades de Parintins, Maués, Barreirinha y las aldeas, en visitas por diferentes casas de sus parientes. Este ir y venir que entrelaza relaciones y conforma localidades, engendra un delicado proceso de construcción y descomposición del parentesco. Esta exposición se enfoca en las historias familiares de los indígenas que circulan por la capital y su entrelazamiento con las historias de parientes en otros lugares, espacial y temporalmente. Historias, entiéndase bien, siempre siendo tejidas, hilo a hilo, en la interacción cotidiana.

Palavras-chave: Amazônia, ciudad, Sateré-Mawé, circulación, parentesco

 

 

2ª sessão: Gênero, desejos e cidade/Genero, deseos y ciudad

Debatedor: Andrés Salcedo Fidalgo (Universidad Nacional de Colombia)

 

 

FUTEBOL FEMININO, DA PERIFERIA AO CENTRO: GÊNERO, CIRCULAÇÕES E SOCIABILIDADES NA CIDADE DE SÃO PAULO

 

Mariane da Silva Pisani (USP)

 

O presente paper, parte da pesquisa de doutorado em Antropologia Social, traz à discussão os processos de circulação e sociabilidade entre mulheres jogadoras de futebol da cidade de São Paulo. Ao acompanhar os trajetos e apropriações de diferentes espaços urbanos por estas mulheres atletas em São Paulo, é possível perceber como a cidade se torna ela mesma agente de afetos e interações na construção de seus modos de vidas. As fronteiras entre centro e periferia, capital e interior transbordam e são borradas a partir da prática do futebol feminino, vivido como esporte, profissão e modo de habitar. Para estas constantes reconfigurações de paisagens e atores urbanos, é preciso considerar as diferentes ativações de categorias como gênero, raça e sexualidade, que adquirem diferentes feições nos múltiplos contextos e práticas das jogadoras por estes trajetos e cenários, mobilizando nessa análise problemáticas concernentes à Antropologia Urbana e os Estudos de Gênero. Dessa forma, a cidade de São Paulo, pode ser repensada a partir da sociabilidade construída através da prática do futebol feminino. Para além das análises teóricas, a prática do futebol feminino de fato permite o acesso e a circulação dessas mulheres na cidade e no estado de São Paulo de maneira mais fluída, intensa e vívida.       

Palavras-chave: futebol feminino, cidade, gênero, circulação.

 

 

CORPO RECORTADO: PRODUÇÃO ESPACIAL DE DIFERENÇAS E HOMOSSEXUALIDADES EM DUAS CENTRALIDADES NA CIDADE DE SÃO PAULO (BRASIL)

Bruno Puccinelli (Unicamp)

 

A presente comunicação parte de doutorado em andamento numa perspectiva comparativa com dados produzidos através de etnografia, idas a campo, entrevistas e coleta de material impresso. A pesquisa problematiza divisões semânticas espaciais em torno de definições de sexualidade em duas regiões centrais da cidade de São Paulo, República e Consolação. Me filio teoricamente a abordagens que têm tematizado espaço urbano e sexualidade em consonância (Néstor Perlongher, 2008) e questionado epistemologicamente gênero e espaço (Doreen Massey, 2005). Tais abordagens auxiliam no treinamento do olhar e na análise dos dados, desconstruindo fixações acerca da ideia de “rua gay” na Consolação. Tais enunciados de frequentadores da Rua Freia Caneca (Consolação) a contrapõe ao espaço da República, tido como mais afeminado, negro, pobre e doente, ou um espaço “bicha”. As diferenças espaciais supostamente dadas entre as duas centralidades mostram um jogo constante de produção de desigualdades a partir trânsitos dos frequentadores da República. Comparativamente tais trânsitos têm mostrado a necessidade de abordagem das duas espacialidades como uma conexão móvel entre lugares com ampla oferta de lazer direcionada a homens com condutas homossexuais. Nesse sentido, se torna mister uma abordagem inerseccional na qual marcadores como raça e classe em consonância com espaço e gênero se tornam preponderantes para a compreensão da produção de espaços homossexualizados e cuja centralidade depende do contexto de enunciação. Para esta apresentação trago o campo realizado em dois espaços abertos de ocupação com fins de lazer que exemplificam a operação contingente de diferenciação, alocando espaços e sexualidades centrais e periféricas.

Palavras-chave: Espaço Urbano; Gênero e Sexualidade; Interseccionalidade, Homossexualidade; São Paulo.

 

 

FAZER BANHEIRÃO: AS DINÂMICAS DAS INTERAÇÕES HOMOERÓTICAS NOS SANITÁRIOS PÚBLICOS DA ESTAÇÃO DA LAPA

 

Tedson Souza (UFBA)

 

As pesquisas de sexualidade in loco são bastante insólitas no campo da Antropologia, essa situação se agrava quando as variáveis sexualidade, classe, raça e gênero são tomadas para compreender as interações sexuais entre homens nos espaços públicos das grandes cidades. A fim de compreender tal dinâmica, procedemos, através de uma abordagem autoetnográfica, uma investigação das práticas de “pegação” em banheiros públicos masculinos da Estação da Lapa – maior terminal de ônibus urbano de Salvador. O objeto é a deriva urbana da pegação no Centro da Cidade por onde transitam sujeitos que praticam sexo ocasional e não comercial entre homens, nas negociações e consórcios episódicos tecidos no – e no entorno do – “banheirão”. Percebemos que, para além de um simples terminal com um sanitário, a Estação da Lapa é ressignificada como espaço de práticas sexuais de desejos dissidentes, na direção de interesses tão diversificados quantos são os sujeitos que interagem na cena e que só são reunidos aqui pelo traço em comum dos desejos, diversificadamente, homoorientados. Problematizamos também o modelo de masculinidade hegemônica presente no imaginário brasileiro, discutindo novos modelos de eroticidade heterossexual masculina possíveis na prática do “banheirão”. Os relatos de campo ilustram identidades de homens que se auto-definem como heterossexuais, mas cujas práticas alteram, de certo modo, a matriz heterossexual hegemônica, fugindo do que se convencionou permissível para um “macho” dentro da conjuntura social brasileira. Lançamos o olhar para essas heterossexualidades “periféricas” e, para isso, também é necessário discutir qual o discurso que regula a eroticidade heterossexual hegemônica.
Palavras-chave: Corpo. Homossexualidade. Gênero. Raça. Autoetnografias

 

 

DES-ARMANDO CUERPOS Y SEXUALIDADES. IDENTIDADES Y CUERPOS TRANS EN EL CARIBE COLOMBIANO

 

Alexander Pérez Alvarez (Universidad de Cartagena)

 

Este trabajo es un avance  de un proceso investigativo para mi tesis doctoral,  realizado por el autor, atraves del trabajo activista y academico  la Corporación Caribe Afirmativo,  en las ciudades de Cartagena, Barranquilla y el municipio de Maicao en el  departamento de la Guajira acerca de cómo se construyen y fabrican representaciones sociales alrededor de las identidades y cuerpos trans en la región.  Donde prima un componente etnico racial y  terriorial  determinante de dichas representaciones.  Sumado a un entramado de exclusiones, resistencias y acciones de violencia sociopolitica que situan a las personas trans en un espacio de periferia geográfico, político y social. El proposito de la ponencia es analizar a partir de un trabajo etnografico,  las maneras como se re-producen discursos  oficiales y acciones de discriminación y exclusión  hacia las identiades y cuerpos trans en el Caribe Colombiano.  Analizando como los prejuicios y las violencias se acentuan cuando estos cuerpos no pueden situarse en los

ordenes binarios de la masculinidad y feminidad, cuando tienen una característica etnico racial –negra o indigena y cuando habitan en territorios con presencia de grupos armados ilegales. La voces y las experiencias vividas nos permitiran dotar de sentido y analizar las formas de poder ejercidas  alrededor de los cuerpos y las sexualidades perifericas.  Los significados de vivir con miedo, pero tambien las maneras en que los cuepos resisten y persisten.

Palabras Claves: Cuerpos abyectos- Territorio y sexualidades- Etnia y sexualidad-  representaciones binarias y heteronormativas – conflicto armado y sexualidad normativa.

 

 

ENTRE ESTRADAS, CARONAS E CAMINHÕES: CÓDIGOS DE MASCULINIDADE DE PESSOAS CAMINHONEIRAS VIA RÁDIO AMADOR

 

Arthur Fontgaland (USP)

 

Este trabalho objetiva discutir algumas questões decorrentes da pesquisa de mestrado em desenvolvimento intitulada Na boleia do caminhão: os códigos de masculinidades de pessoas caminhoneiras via rádio amador. Tal investigação dialoga com o entendimento sobre as configurações de práticas em torno das posições dos homens no sistema das relações de gênero, comumente conhecido como estudos de masculinidades. Parto do pressuposto que masculinidade e feminilidade não correspondem necessariamente a homem e mulher, mas são possibilidades de ações acessíveis tanto a mulheres, quanto a homens, imbuídas de poder. Assim, as associações estabelecidas entre homem-masculino-poder podem ter caráter contingente e não fixo, variando conforme práticas e situações criadoras e apresentadoras das noções de masculinidades. Nesse sentido, esta pesquisa etnográfica se debruça sobre o universo de caminhoneiros e caminhoneiras composto pela circulação de corpos, ideias, artefatos em sequências tanto no interior da boleia dos caminhões, quanto em trânsito nos postos de pesagem, postos de gasolina e nos demais aparelhos e eventos dispostos às margens das rodovias. Tomando a utilização do rádio amador como uma das práticas que expressam parte das múltiplas experiências de pessoas caminhoneiras, busco compreender como a construção e utilização dos chamados “códigos de caminhoneiros”, veiculados através do rádio amador PX, tornam concretas as ideias de masculino produzidas e reproduzidas nas situações de deslocamentos interurbanos vivenciadas por motoristas de caminhão. Esta etnografia se apóia em caronas articuladas com motoristas de caminhão que trafegam na Rodovia Presidente Dutra (402 km), responsável por ligar duas grandes cidades brasileiras, São Paulo e Rio de Janeiro.

Palavras-chave: deslocamentos interurbanos; masculinidades; pessoas caminhoneiras; códigos de caminhoneiros.

 

 

PODE SENTAR, ESSE É O SOFÁ DA HEBE: UM BREVE RELATO DE SACHENKA SOBRE O BAIRRO EDUTO EM BELÉM DO PARÁ

 

Amadeu Lima de Deus (UFPA)

 

O artigo em questão trata do bairro Reduto de São José ou, para os mais íntimos, apenas Reduto. A partir de um breve exercício etnográfico proponho analisar as relações interpessoais no bairro do Reduto, tendo como fonte de informações as narrativas de uma travesti que há pelo menos quinze anos, tem trabalhado com trottoir nas ruas do logradouro. A partir da perspectiva Sachenka sobre o bairro conseguimos perceber a cidade, pelo olhar de quem vive da rua e percebe seus mais variados significados para além do ir e vir de pessoas pelo espaço urbano. O artigo fala do bairro e da pessoa travesti que nele atua, socializa e cria suas táticas para uma convivência sempre negociável. A partir do anoitecer as deambulações pelo arrabalde indicam o transito social dos sujeitos diversos, principalmente pelo fato de encontramos nele algumas personagens que transitam por suas ruas escuras e lúgubres, animando as suas noites, constituindo parcela importante de uma vida que pulsa naquele contexto. A presença de tais personagens, como as travestis que realizam o trottoir em suas ruas e esquinas, entre outras figuras que vagam nas noites do bairro, não ocorre de maneira aleatória. No Reduto, as ruas que eram públicas passam a medida que anoitece a ter “titulo de propriedade”, pois cada esquina tem uma ou mais donas, os limites são simbólicos porem sempre respeitados para a manutenção de uma ordem. Diante de tais configurações sociais o bairro carrega consigo uma imagem estigmatizada, vibrando como uma espécie de “mancha social” no corpo da urbe. Ele pode ser entendido como uma “região moral”, no sentido atribuído por Park (1952) a tais espaços urbanos. Constitui desta maneira uma área na qual convergem imagens que contribuem para a produção de narrativas que circulam pela cidade, mesclando historias oficiais e lendárias de forma a animar o “imaginário urbano” (Certeau, 1993), envolvendo uma região citadina onde fulguram desejos não convencionais.

Palavras-chave: Reduto, travesti, prostituição, cidade

 

 

SEGUINDO SEMENTES: TRAJETOS E CIRCUITOS SATERÉ-MAWÉ ENTRE CIDADE E ALDEIA

 

Ana Luísa Sertã Almada Mauro (USP)

 

A presença Sateré-Mawé na cidade de Manaus (Amazonas, Brasil) se faz particularmente visível pelas comunidades e associações que começam a surgir na cidade na década de 1990, a partir de ocupações que contaram com forte protagonismo feminino. O artesanato elaborado com sementes passou a ser uma das principais estratégias das mulheres Sateré-Mawé no espaço urbano, em oposição ao trabalho nas chamadas “casas de família”. Partindo da identificação de uma ampla circulação mobilizada por sementes na cidade, procura-se aqui acompanhar os caminhos por elas traçados dentro de um circuito (Magnani, 2000) que parte de Manaus e a ultrapassa, envolvendo também suas proximidades, aldeias Sateré-Mawé na terra indígena Andirá-Marau, e municípios próximos à TI. A partir dos trajetos das sementes pretende-se abordar relações multilocais estabelecidas entre indígenas e não-indígenas, cidade e aldeia. A circulação de sementes identificada mobiliza modos particulares de caminhar dentro do espaço urbano e estabelecer relações com seus diversos atores, ao mesmo tempo em que demanda deslocamentos e negociações que ultrapassam fronteiras entre cidade e aldeia. O modo como as sementes são adquiridas, coletadas, trocadas, plantadas, e transformadas em objetos que circulam em diferentes locais e contextos nos leva a pensar uma inversão entre agente e paciente: ao invés de pensar as sementes como objetos passivos da ação humana trata-se de lançar um olhar às sementes como agentes mediadores de relações, capazes de impulsionar a circulação constante de pessoas, narrativas e coisas.

Palavras-chave: sementes, mulheres, Sateré –Mawé, circulação, trajetos

 

 

3ª sessão: Marginalidade, violência e corpo/Marginalidad, violencia y cuerpo

Debatedora: Silvana de Souza Nascimento (Universidade de São Paulo)

 

 

USUÁRIOS DE ABRIGOS DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO: TRAJETÓRIAS, CIRCULAÇÃO, REDES, PRECARIEDADE E SOBREVIVÊNCIA

Raquel Martini Carriconde (UERJ)

 

O trabalho que pretendo apresentar é fruto de uma pesquisa que viemos realizando com usuários de abrigos da cidade do Rio de Janeiro. Nesta pesquisa, nossa intenção é: acompanhar estes em suas trajetórias sociais, apreender os saberes produzidos e mobilizados para sobreviver na cidade, suas formas de circulação, de viração e os circuitos e redes necessários para viabilizar isso tudo (redes religiosas, filantrópicas, afetivas, familiares e da assistência); entender as relações que estabelecem com o espaço urbano, os mapas afetivos que constroem, as fronteiras que identificam e as que atravessam; entender as relações que estabelecem com o trabalho formal/informal; mapear, compreender e problematizar os agenciamentos necessários para seus deslocamentos e sobrevivência; compreender a construção de suas subjetividades. Por essas intenções, interessa debater essa pesquisa junto a esse grupo de trabalho, sublinhando as passagens pelas fronteiras corporais, sexuais, étnico-raciais, culturais e espaciais dando destaque para suas estratégias de sobrevivência nessas circunstancias e para a constituição de suas subjetividades nos atravessamentos dessas fronteiras atravessadas, por sua vez, por esses diferentes marcadores sociais. Coloco, por fim, que o momento em que realizamos essa etnografia é posterior a Copa do Mundo e precede às Olimpíadas, sendo esse contexto sócio político e econômico forte condicionante dos deslocamentos desses grupos da (re)criação e deslocamentos de fronteiras. 

Palavras-chave: redes, abrigos, cidades, fronteiras, Rio de Janeiro

 

 

AS TECNOLOGIAS DO ASSALTO: NOTAS ETNOGRÁFICAS SOBRE O ROUBO A MÃO ARMADA NO RIO DE JANEIRO

 

Carolina Christoph Grillo (CPDOC/FGV-Rio)

 

No Rio de Janeiro, o roubo a mão armada constitui uma das principais ameaças percebidas pelos habitantes da cidade, no entanto, as pesquisas sobre criminalidade urbana tendem a centrar-se na figura do traficante, conferindo pouquíssima visibilidade ao ladrão. A prática de assaltos transcorre com alguma independência com relação ao tráfico e envolve problemas bastante peculiares para se lidar com. Diferentemente dos traficantes, que trabalham em territórios protegidos por uma contenção armada e/ou acordos espúrios com a polícia, os ladrões atravessam as fronteiras tácitas entre o “morro” e a “pista”, aventurando-se armados por territórios regularmente policiados, onde se sujeitam a riscos muito mais elevados de serem presos, feridos ou mortos. Traficantes também tendem a impor limites e punições aos ladrões, de modo a evitar que atraiam a repressão policial para a favela e atrapalhem seus negócios. Diante dos perigos a que se submetem, os ladrões precisam desenvolver uma série de habilidades e técnicas para minimizar a margem de imprevisibilidade inerente às suas atividades, o que inclui dirigir em alta velocidade, mapear os melhores trajetos, selecionar e coagir suas vítimas, driblar e/ou trocar tiros com a polícia e enganar e/ou conquistar a aquiescência de traficantes. Com base numa etnografia realizada com assaltantes que residem em favelas cariocas controladas pelo Comando Vermelho, este trabalho visa a descrever a prática do roubo à mão armada – especialmente o roubo a transeuntes e roubo de veículos –, atentando-se para as performances e tecnologias acionadas pelos ladrões para fazer dos assaltos um meio de vida.

Palavras-chave: Roubo, Rio de Janeiro, tecnologia, performance.

 

 

VIVER NAS RUAS DA CIDADE: OS USUÁRIOS DE CRACK E AS NOÇÕES DE CORPO E PESSOA

Marcelly de Freitas Gomes (UFF)

A categoria corpo deve ser pensada como produção de corporalidades, “que se constrói na relação com outros corpos e na interface com a dimensão espacial e social das ruas da cidade”.Os usuários de crack em situação de rua experienciam a cidade de forma particular e contextualizada. O objetivo desta pesquisa é refletir sobre os processos normativos/classificatórios que esquadriam os corpos dos usuários de crack em situação de rua e delimitam fronteiras físicas e simbólicas. Trata-se de uma pesquisa etnográfica com os usuários de crack em situação de rua, por meio do acompanhamento do trabalho da equipe de Consultório na Rua que atua nos territórios de Manguinhos, RJ/Brasil realizada ao longo de 2014. Evidenciamos que os sujeitos da pesquisa criam novas territorialidades com seus corpos, extrapolando as fronteiras delimitadas pelas “normas” sociais. Os limites de ordenação que esquadria os corpos imputam aos usuários de crack uma interação dolorosa com a cidade, mas ainda assim são frouxos e resignificados, na medida que constitui uma corporalidade no avesso daquilo que o imaginário urbano cria e formata. Ao falar daquilo que parece caracterizar os usuários de crack, enfatiza-se a descrição de traços corporais depreciados e posturas morais “condenáveis”: a sujeira e o corpo emagrecido tornam-se os seus atributos corporais mais destacáveis. Assim, a ênfase recai sobre a problemática da corporalidade e do uso de drogas como meios para a produção de determinados tipos de pessoas, “expondo seus corpos ‘marcados’, em uma forma de estar no espaço público que os identifica como usuários de crack”.

Palavras-chave: Antropologia do corpo;  Antropologia urbana; usuários de crack;  viver na rua; corpo e cidade.

 

 

SABER VIVER: RISCOS, APOSTAS E SOBREVIVÊNCIAS EM UMA FAVELA DO RIO DE JANEIRO

Tássia Mendonça (Museu Nacional/UFRJ)

 

Nesta comunicação apresento através de um exercício etnobiográfico as constituições mútuas entre corpo e território, raça e gênero em uma favela carioca. A partir de análises presentes em minha dissertação de mestrado, descrevo as estratégias de sobrevivência, os riscos e as apostas que atravessam a trajetória de Cássia, mulher negra moradora do Batan – favela da Zona Oeste do Rio de Janeiro – há mais de 40 anos. Dos bailes da década de 80, das travessias da Avenida Brasil, dos casos de X-9, dos episódios de violência doméstica e sexual, dos filhos executados pela polícia e pelo tráfico, dos filhos expulsos pela milícia, dos gritos, dos silêncios, dos alívios e das dores.

A proposta teórico-metodológica é discutir os limites da constituição de uma corporalidade negra que não se distingue de uma contiguidade territorial, na conformação de territórios negros, ou ainda, como corpos negros se constituem eles mesmos enquanto territórios de resistência. Trata-se de uma descrição analítica daquilo que Cássia chama de saber viver: os conhecimentos necessários à sobrevivência cotidiana, a capacidade de transitar entre os distintos poderes armados e políticos (tráfico, milícia e polícia). Discuto assim como os movimentos de Cássia – de enfrentamento, recuo e aposta – constituem mutuamente seu corpo, os corpos de seus filhos e a própria favela enquanto território.

Proponho pensar a relação corpo-território entre Cássia, seus filhos e o Batan inspirada nas reflexões de Maria Lugones (2014) e Gloria Anzaldua (1987) pensando na constituição ao mesmo tempo racializada e sexualizada do corpo da mulher negra tanto nos termos daquilo que Lugones chama de “fissura” quanto da reflexão de Anzaldua sobre a mulher chicana e negra e seu lugar na “fronteira”. Além disso, autoras como Audre Lorde, Angela Davis e Bell Hooks permitem analisar a conformação das subjetividades, emoções, silêncios, raivas e experiências da mulher negra como sujeito político inscrito na linha entre pertencimentos (de raça e gênero) distintos. Em suma, a presente comunicação tem por objetivo analisar as ressonâncias entre corpo:território::raça:gênero e sua articulação a partir de uma etnografia da violência e do poder na(s) história(s) de uma mulher negra e moradora de favela, em seu cotidiano de riscos, apostas e sobrevivências.

Palavras-Chave: Favelas; Corpo; Território; Raça; Gênero.

 

 

JOVENS ENTRE FRONTEIRAS E CIRCULAÇÕES NA CIDADE: UMA COMPARAÇÃO ENTRE OS CONTEXTOS URBANOS DO RIO DE JANEIRO E DE CAMPOS DOS GOYTACAZES/RJ

 

Carolina de Oliveira Siqueira

Teresa de Jesus Peixoto Faria (UENF)

 

Este artigo tem como objetivo descrever como jovens “de periferias” definem fronteiras visíveis e invisíveis quando circulam nos espaços urbanos e problematizam os efeitos e os riscos das aproximações com facções rivais que “dominam” o comércio de drogas ilegais. Partindo dos resultados parciais do projeto de pesquisa de mestrado Territórios proibidos? Uma análise das circulações e práticas sociais de jovens e periferia de Campos dos Goytacazes, em andamento no Programa de Pós-Graduação de Políticas Sociais (UENF), realizaremos uma comparação por contraste das circulações de “jovens de periferias” na cidade do Rio de Janeiro em relação àquelas de Campos. Nesta análise, fundamentada em entrevistas em profundidade, procuramos mapear representações “de jovens de periferia” de Campos dos Goytacazes/RJ acerca das circulações e práticas nas margens do tráfico de drogas. Para realizar a comparação proposta, partiremos, no caso do Rio, do artigo “Da asfixia: reflexões sobre a atuação do tráfico de drogas nas favelas cariocas” de Juliana Farias (2008) no intuito de identificar os pontos contrastantes entre estes dois contextos urbanos em particular no que se refere aos modos de problematizar as circulações, práticas e percepções destes atores. Demonstraremos que as fronteiras em ambas às cidades são maleáveis de acordo com a posição social do jovem e com as maneiras segundo as quais representa e é representado nas suas relações de vizinhança e

Palavras-chave:Circulações, Fronteira e Juventude

 

 

FRONTEIRAS ENTRE O ANONIMATO E A VISIBILIDADE: DIREITOS, EMOÇÕES E SUBJETIVIDADES (CORPORIFICADAS) NA EXPERIÊNCIA COM HIV/AIDS

Ricardo Andrade Coitinho Filho (PPGCS-UFRRJ)

 

Este paper retrata a dimensão política e social do contexto do HIV, vivenciado por jovens soropositivos que frequentam uma “rede” no estado do Rio de Janeiro. Em decorrência às representações negativas associadas a Aids e a discriminação e preconceito oriundos destas representações, a experiência soropositiva tem sido permeada por controvérsias. Neste sentido, algumas “angústias”, “medos” e “perspectivas” são enunciadas dentro de uma coletivização – a rede. Essa discursividade que é ao mesmo tempo compartilhada, é também (re)construída ao longo da trajetória soropositiva e por meio das experiências que são trocadas. Dentre estas discursividades, se atentará, neste trabalho, a problematizar a demanda por direitos que são erigidas por estes jovens – como o direito à dignidade ao portador do hiv/aids, o direito ao uso do tratamento com os antirretrovirais, a luta contra a discriminação em relação a sorologia e outras questões correlatas. No entanto, esta demanda por direitos é permeada por estratégias que circundam entre o anonimato e a visibilidade. Interessa, neste sentido, apresentar as estratégias utilizadas por estes jovens na busca pelos seus direitos e as moralidades em torno desta atuação. Serão utilizados, como referência para esta discussão, os dados etnográficos feitos na rede, entrevistas semiestruturadas com os jovens participantes da mesma, materiais de veiculação midiática (como entrevistas concedidas por estes jovens a alguns jornais de circulação estadual) e as políticas públicas em saúde para o HIV. 

Palavras-chave: HIV, Direitos, Emoções, Subjetividades, Corpo.

 

 

DEMARCADORES TERRITORIAIS: CORPO E POLÍTICA DA DIFERENÇA NO MOVIMENTO SOCIAL DOS SURDOS

 

Maria Izabel dos Santos Garcia (UFF)

 

De algum modo todos temos certo entendimento prévio do que vem a ser um corpo. Não só pela experiência intrínseca que temos com nosso próprio corpo – algo dado, que nos pertence – como também um elemento demarcador de fronteira entre o eu e outrem – um corpo em meio a tantos outros. A ideia de corpo também pode vir atrelado ao conceito de identidade quando alguns autores apresentam categorias como terceira idade, idade da loba, crise da meia idade, para citar apenas algumas, nas quais o tempo do corpo – marcado pela ideia biologizante da idade cronológica – se apresenta como um elemento que se enoda a outros que, como tal, apresenta configurações que assemelham o corpo do jovem, o corpo do idoso, o corpo maduro, o corpo feminino... Entretanto, esses elementos ditos comuns, aparentemente relacionados ao aspecto do corpo e, portanto, biológicos, vêm acompanhados de uma história. Em Espinosa temos clara a afirmação do corpo como uma entidade de potência. Ele aposta na potência deste corpo não subjugado ao espírito – solução cartesiana – nos apresentando a algo aparentemente paradoxal, quer seja, de sermos e não sermos a um só tempo esse corpo. Interessa aqui ressaltar a vida como princípio ético organizador para a produção de uma arte. A arte de viver. Para tanto se faz necessário, primeiramente, problematizar o que possa impedir sua expansão para em seguida cogitar tal inversão de territórios que a viabilizem. Este percurso nos levará ao relato de experiências de pessoas que exprimem a potência da vida em corpos ditos deficientes. No caso dos surdos, como diferentes autores apontam (Skliar, Sanches, Wrigley e outros), o lugar da deficiência vem sempre acompanhado de um sentido ouvintista de discernir sobre a surdez. O movimento pelos direitos das pessoas com deficiência prima pela defesa do que chamam de “identidade”. Pensamos ser os conceitos de cultura e identidade reificantes e reacionários – um debate já presente na antropologia contemporânea – na medida em que se pautam não na emergência de um novo, e sim em um padrão majoritário esperado, estando a própria ideia de padrão a serviço de uma relação de poder a partir de um padrão que não representa ninguém. Em oposição à ideia de reconhecimento de identidade, Guattari propõe a ideia de processos transversais, devires subjetivos, que se instauram através de indivíduos e grupos sociais, podendo dessa forma entrar em ruptura com as estratificações dominantes. Vale ressaltar, que tais processos não podem existir em si mesmos, mas sim num movimento processual. O presente trabalho pretende ser uma breve incursão sobre esse processo e as práticas discursivas que ensejam promover uma nova visibilidade da surdez a partir dos conceitos de cultura e identidades surdas, usados com a intenção de demarcar território para uma política da diferença.

Palavras-Chave: Surdos, deficiência, identidade, território, cultura.